Mário - Parte II
Mário ensinava português no Liceu Camões a alunos com metade da sua idade, com hábitos, relações e dizeres muito diferentes dos que tinha aquando dessa idade. Mas isso não o preocupava – fazia-lhe alguma confusão, é certo – tal era o prazer por ensinar, dar conhecimento a estes jovens que estavam sôfregos por tal, assim o desejava. Nas suas turmas sempre houve alunos problemáticos, menos educados e/ou agressivos que a média, mas nada o preparou até ao dia em que um o agrediu porque lhe tinha dado uma má nota num trabalho sobre Luís de Camões. Mário após esse incidente não mais conseguiu voltar a entrar numa sala de aulas. Ainda tentou mas a caminho da escola o ar começava a faltar; suava abundantemente das axilas; as mãos escorregadias pareciam deixar fugir a mala que carregava; a gravata era alvo de constante ajeitar; as pessoas pareciam olhá-lo directamente, indagavam com os olhos perguntas que não percebia; o chão flutuava e Mário só queria fugir daquele caminho e destino que o assustava, o deixava completamente inseguro de si. Nos primeiros dias ainda chegou à primeira aula, mas após poucos minutos de sufoco, desmemoriado e quase em pânico perante os seus alunos, acabava por dar a aula por terminada e fugia para casa, único sítio onde se sentia protegido de tudo e de todos, mas principalmente de si.